
Pálpebras descaídas? Check. Músculo do adeus flácido? Check. Rugas nasogenianas marcadas? Check. Podemos ser todas diferentes, mas há preocupações que parecem universais no universo feminino. E talvez só uma mente pragmática, como a de uma engenheira química, conseguisse olhar para esses pontos em comum e transformá-los na base de uma marca de cosméticos pensada para dar resposta a necessidades reais.
Engenharia química aplicada à pele: é assim que Estefanía Ferrer descreve a missão da LICO, marca que fundou em 2021 depois de trocar a Airbus por um laboratório cosmético. LICO significa “Laboratório de Engenharia Cosmética” - e não é metáfora. Com uma abordagem quase farmacêutica à formulação, rigor clínico nos testes e foco em resultados mensuráveis, a marca espanhola está a conquistar o mercado ibérico com produtos que aliam ciência, sensorialidade e impacto visível. Em entrevista à Miranda, Ferrer revela como tudo começou, o papel da engenharia no skincare e porque acredita que a transparência é o futuro da beleza.
LICO significa “Laboratório de Engenharia Cosmética” - até que ponto este nome define a missão da marca?
O nome LICO nasceu com uma missão muito clara: tratar a pele com a mesma seriedade e rigor com que se desenvolve uma fórmula num laboratório de engenharia. Quis criar uma marca que não soasse a apenas mais uma, mas sim a um projeto com base científica, desenvolvido por engenheiras, que prometesse resultados reais e tangíveis. “Laboratório de Engenharia Cosmética” resume perfeitamente o que somos - um espaço onde a tecnologia e a Natureza se encontram para responder com precisão às necessidades reais da pele.
A LICO nasceu em 2021, mas foi uma transição que partiu de uma base sólida: hobby, laboratório caseiro, Airbus… Que momento marcou a passagem de paixão a projeto profissional a tempo inteiro?
O momento decisivo foi o impacto do primeiro tratamento que formulei: o African Essence. Criado inicialmente para uso pessoal e partilhado entre amigas, percebi rapidamente que aquele produto preenchia uma lacuna no mercado. A partir daí, deixei para trás os “testes” e comecei a estruturar tudo com uma visão empresarial: ensaios clínicos, design, branding, produção em escala... A transição foi natural, mas exigiu coragem - e uma grande paixão pela ciência cosmética.

Como é que a Engenharia Química influencia cada etapa da formulação e produção de cosméticos? Há alguma aplicação específica que tenha sido decisiva?
Influencia absolutamente tudo. Desde o desenho da fórmula aos testes de estabilidade, aplico constantemente conceitos da engenharia química: cinética de reação, biodisponibilidade, análise de materiais, compatibilidade entre ativos… Um exemplo prático? A encapsulação do retinol, que permite garantir eficácia sem causar irritações. Sem esse conhecimento técnico, seria impossível desenvolver produtos que atuam em profundidade e, ao mesmo tempo, respeitam a pele.
Num mercado em que o “natural” muitas vezes exclui o “eficaz”, como combina ingredientes naturais de alta qualidade com tecnologias inovadoras?
Na LICO, o natural e o eficaz não competem, complementam-se. Utilizo ingredientes naturais de origem exótica em conjunto com tecnologias que melhoram a sua absorção, estabilidade e eficácia. Um bom exemplo é o Córsica Essence, o nosso tratamento antienvelhecimento para lábios. Combina óleo de semente de ameixa e extrato de mirtilo europeu com um sérum esfoliante químico à base de ácidos de frutos e uma solução refirmante com péptidos biomiméticos. Natural, tecnológico e com resultados clínicos visíveis em sete dias.
Os ensaios clínicos feitos garantem resultados visíveis em sete dias. Que métodos utiliza para medir esses efeitos e como os comunica à comunidade?
Trabalho com laboratórios independentes que seguem protocolos reconhecidos, como a análise de imagem com Visia, cutometria, corneometria ou avaliação dermatológica direta. Quando afirmo “7 dias”, é porque existem dados a comprová-lo e partilho sempre esses resultados com total transparência. A comunidade LICO valoriza tanto o rigor científico como a sensorialidade dos produtos.
Utiliza matérias-primas provenientes de zonas remotas (Kalahari, Amazónia, ...). Como garante que esses produtos são sustentáveis, éticos e benéficos não só para a pele, mas também para as comunidades locais?
Seleciono fornecedores com certificações ambientais e éticas, e dou prioridade a colheitas sustentáveis e ao comércio justo. Acredito que a beleza só faz sentido se for respeitosa com o planeta e com as pessoas que dele fazem parte.
Quais são as tendências ou linhas de investigação cosmética atuais que mais a fascinam?
Estou especialmente atenta à biotecnologia aplicada à cosmética, sobretudo ao desenvolvimento de péptidos de nova geração, biofermentos e sistemas de encapsulamento. Acompanho também com grande interesse a cosmética regenerativa e os estudos sobre o microbioma cutâneo. Acredito que o futuro passa por fórmulas altamente técnicas, mas cada vez mais seguras, sensoriais e transparentes.
Espanha está a consolidar-se como “fábrica” de grandes marcas cosméticas. Em que áreas sente que a LICO marca a diferença face a outras marcas?
A diferença está no ponto de partida: a LICO é uma marca de engenharia, não apenas de marketing. Muitas marcas trabalham muito bem a comunicação; eu começo pela fórmula. Testo cada produto como se fosse um projeto de investigação. Além disso, mantenho uma relação muito próxima com a comunidade – escuto muito antes de lançar, e esse feedback técnico e emocional é inestimável.
Qual é o interesse específico pelo mercado português? Que diferenças encontrou nos hábitos de beleza das portuguesas em comparação com as espanholas?
Portugal é um país com uma forte cultura de cuidado e uma ligação muito profunda à Natureza, algo que ressoa bastante com os valores da LICO. As portuguesas valorizam a eficácia, mas também a textura, o aroma, a experiência completa... São consumidoras exigentes e sensíveis, o que me desafia a comunicar de forma mais emocional e próxima. Em Portugal, estamos a crescer com muito carinho e respeito.
Já foi entrevistada várias vezes em Espanha. Se tivesse de apresentar a LICO pela primeira vez a uma consumidora portuguesa, o que diria de diferente?
Diria que a LICO é uma marca com alma científica e um coração profundamente humano. Que sou uma engenheira apaixonada por criar fórmulas que funcionam, mas que também emocionam. Que cada produto é feito com rigor, mas também com beleza. E que quero conquistar a confiança das portuguesas com verdade, resultados e muito carinho.
A aposta da LICO é totalmente online. Planeia entrar em farmácias, spas ou perfumarias em Portugal? Há planos de eventos, pop-ups ou colaborações locais?
Para já, pretendo manter o ADN digital da marca. Estão previstos alguns eventos e colaborações locais, porque acredito na importância do contacto real com a comunidade portuguesa. Portugal não é apenas um mercado, é parte da história da LICO.
O que gostaria de fazer no universo cosmético e ainda não conseguiu, seja um formato de produto, um ingrediente “fora da caixa” ou uma nova forma de comunicar com o consumidor?
Gostava muito de criar fórmulas personalizadas com base num diagnóstico de pele para levar a personalização ao próximo nível. E, quem sabe, no futuro… abrir um espaço físico que una ciência, beleza e experiência. Um verdadeiro “Laboratório de Engenharia Cosmética” aberto ao público.
Que conselhos daria a alguém que está a lançar uma nova marca de beleza?
- O meu primeiro conselho é: sê honesta com o propósito da tua marca. Pergunta-te “porquê” antes de tudo. Há muito ruído no mercado e os consumidores percebem quando uma marca não tem alma.
- Em segundo lugar, investe na formulação e na qualidade antes do marketing. Podes ter a melhor campanha do mundo, mas se o produto não entregar resultados, as pessoas não voltam a comprá-lo.
- Terceiro: ouve quem te compra. Na LICO, aprendi imenso com a comunidade. Essa escuta ativa é o que permite evoluir, melhorar fórmulas e lançar produtos que façam realmente sentido.
- E, por fim, não tenhas medo de ser transparente. Explica como fazes as coisas, de onde vêm os ingredientes, porque tomas determinadas decisões. A confiança é o maior património de uma marca de beleza e constrói-se todos os dias com coerência, rigor e carinho.
Madalena Alçada Baptista é jornalista há vinte anos, muitos deles dedicados à área da beleza. A sua personalidade curiosa e formação em jornalismo de investigação levaram-na a entrevistar perfumistas, cientistas, marketeers e fundadores de marcas que amamos, e é isso que faz mensalmente na Miranda, em #BeautyInsider.
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